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2008/04/08


Fantástica fábrica de chocolates de silício

Um grande exemplo do que eu andei falando sobre como as empresas gostam de “encapsular” seus produtos, fingir que eles não são produzidos por seres humanos que vão lá, trabalham e criam aquelas coisas, mas sim que são produtos que surgem por um processo meio mágico. A síndrome de Clarke: “qualquer tecnologia suficientemente avançada é indistignuível de magia”, etc.

Num anúncio de notebook passando no canal Sony, o locutor fala assim: “este é um computador normal. Um dia um funcionário nosso teve uma idéia... E se colocássemos, isto, e aquilo, e fizéssemos essas coisas legais... Este é nosso computador novo... No nome deste nosso funcionário é... a criatividade!...”

Tá aí!... Quem desenvolve computadores não são pessoas, é “a criatividade”, tal como um deus politeísta.

A diferença é que na mitologia grega vc tinha musas (como poderia ser uma “musa da criatividade”) que inspirava pessoas, ou tinha por exemplo um Prometeu que roubava o fogo pra levar pros humanos. Tem heróis que fazem as coisas. Isso que eles tão propondo é um mundo em que as pessoas se disfarçam de deuses-de-Oz que fornecem de graça um maná maravilhoso pro seu povo escolhido.

2008/02/18


Trucando os 5,5GBps da Telefónica

[[ATUALIZAÇÃO: Finalmente encontrei um post bastante informativo sobre a estrutura da rede do Campus Party criada pela Telefónica num blog por aí, escrito por Rafael Rigues]]

Quando ouvi falar que a Telefónica tava oferecendo acesso à Internet a 5,5 gigabytes por segundo para o Campus Party, fiquei empolgado, e na hora já quis botar a rede à prova, e ver o download mais rápido que alguém conseguia fazer. Chegamos a fazer um download a 8,6MB/s, o que até onde eu sei é o record de maior velocidade de download obtida no Campus Party... Continue lendo sobre como fizemos nosso experimento!

Acontece que todos os 5,5 gigabytes por segundo seria muito difícil de testar, porque é muita coisa, não daria pra testar com um PC. Uma placa de Ethernet de um computador pessoal convencional contemporânea possui um limite de 1Gb/s, a famosa "Ethernet gigabit", o que equivalem a aproximadamente 120MB/s (megabytes por segundo, um CD a cada 6 segundos). Os 5,5GB/s no Campus Party são aproximadamente 47Gb/s, o que acredito ser a velocidade de um único link de fibra ótica. Queria inclusive saber se é isso que o pessoal ligou lá. Como além de ser impossível testar com PCs, seria injusto querer ocupar o link inteiro do Campus Party num teste, achei que ia ser interessante fazer só o seguinte: tentar chegar a 1Gb/s em uma máquina normal dentro do Campus Party.

Na verdade eu queria simplesmente registrar o record de download dentro do Campus Party, e criar um “evento”, uma notícia relacionada a essa grande potência de transmissão. Porque não tem graça ficar só ouvindo falar quanto tem aquele canal bandalargado todo lá, o legal é poder contar, por exemplo “eu baixei lá o último episódio do Lost em 10 segundos!!!”

Pra realizar este experimento, tinha que ter duas coisas: uma pessoa dentro do Campus Party que pudesse fazer o download pra mim, e alguém fora disponibilizando um arquivo em um servidor http “evenenado”, capaz de fazer um upload animalescamente veloz. Quem veio me ajudar neste último requerimento foi meu amigo Arlindo Follador lá da UFMG, e o resto do pessoal que cuida das redes do CDPEE. Eles botaram no ar um Apache, com um arquivo de 700MB disponível pra download num certo endereço de IP, e a partir daí foi só pedir pra amigos dentro do Campus Party, e de outros lugares, testarem pra mim o download e anotar a maior velocidade obtida.

...Eu fiz questão de usar um servidor de http mesmo, Apache, bem convencional, e fazer o download via mozilla ou wget. Pra mostrar que quando a rede é boa, é só disso que vc precisa!... Nada de programas cabulosos. (Na verdade cheguei a precisar de um, mas isso fica pra depois.)

Antes dos testes eu já tinha notícia de alguém ter feito um download (acho q num stand da própria Telefónica, não lembro) a ao menos 3,3MB/s de um CD do Ubuntu de um servidor da UFRGS (link?). Queria ao menos chegar nessa velocidade, né??

Pois bem, servidor no ar, começamos a fazer alguns testes, e vimos que infelizmente não ia dar pra testar o gigabit ainda... Acontece que o switch lá no nosso servidor tinha uma porta de fibra ótica, e as outras eram de apenas 100Mb/s... Isso dá um limite de velocidade superior de 12MB/s... Mas ainda assim resolvemos testar!...

Os resultados estão a seguir. Os números entre parênteses são os (mal-)calculados a partir do outro, o medido.


JucaBlues @CP 8.6MB/s (68.8Mb/s) 13/02/2008 23:41
AmigoArlindo (8.43MB/s) 67.4Mb/s 13/02/2008 16:30
CEFALA 8.30MB/s (66.4Mb/s) 13/02/2008 23:02
Carina univ. 3.3MB/s (26.4Mb/s) 13/02/2008 16:30
Nicolau LTI 1.3MB/s (10.4Mb/s) 13/02/2008 16:30
Nathan (.nz) 710kB/s (5.7Mb/s) 13/02/2008 19:30
Nicolau POLI 600kB/s (4.8Mb/s) 13/02/2008 18:30
Cristiano NYC 360kB/s (2.9Mb/s) 13/02/2008 17:30
Sinval >300kB/s 2.4Mb/s 13/02/2008 17:30
Leo A 236kB/s (1.9Mb/s) 13/02/2008 23:46
Nicolau SDF 160kB/s (1.3Mb/s) 13/02/2008 22:55
Luis 116kB/s (0.93Mb/s) 14/02/2008 19:02
Daniel 115kB/s (0.92Mb/s) 13/02/2008 17:30
NF 106kB/s (0.85Mb/s) 13/02/2008 22:55
Carina casa 50kB/s (0.41Mb/s) 13/02/2008 23:23


(nota: ‘B’ = byte, ‘b’ = bit)

O que podemos ver, em primeiro lugar, é que realmente a conexão dentro do Campus Party foi violenta! Nosso amigo lá dentro conseguiu baixar o arquivo ainda mais rápido do que um servidor (CEFALA) que estava ligado dentro do mesmo prédio, mas não pela fibra ótica. A seguir temos algumas pessoas conectadas dentro de outras universidades (em laboratórios convencionais), e depois podemos constatar um resultado interessante: amigos meus no exterior (Nova Iorque e Nova Zelândia) conseguiram taxas acima de amigos meus com conexões convencionais no Brasil!... Isso é legal pra mostrar como que a distância física pode ser muito pouco importante para velocidades de transmissão na Internet. Mas claro que também não é legal ver como que no Brasil temos conexões tão ruins... :P

Bom, discussão dos resultados: Como nosso servidor estava certaemnte limitado a 12MB/s, Não podemos garantir que o os 8,6MB/s obtidos dentro do Campus Party foram por causa de um limite lá dentro, ou um limite de nosso servidor. Mas com certeza até essa velocidade eu garanto que você conseguia obter lá dentro!... Fiquei feliz em quebrar o único outro record que tinha ouvido ter ocorrido lá dentro, desse pessoal que pegou o Ubuntu (e a gente ainda fez numa bancada mesmo, e não num stand). Que eu saiba, esse foi o download (grande) mais veloz realizado dentro do Campus Party!... (Se vc sabe de outro mais rápido, me avise!)

Recentemente obtive mais um dado interessante sobre o assunto: O blog Fernando Corp Music reportou um outro teste de velocidade que parece ter chegado aos 8MB/s, usando o tal velocímetro do rjnet... Se esse teste for bão mesmo, isso significa que os usuários do Campus Party estariam mesmo restritos a um limite de aproximadamente 100Mb/s, parecido com o que tínhamos em nosso servidor... É uma pena que não pudemos colocar um servidor mais animal na UFMG pra gente ter certeza! :/

Só que como não fui eu quem fez esse velocímetro do rjnet, eu não boto a mão no fogo por ele não... Testei agora aqui em minha máquina, e a princípio ele fez uma medição ruim, só de 100kB/s, enquanto que meu download chegou aos 500... Mas medindo repetidas vezes ele foi chegando nesse valor. Eu gostaria de poder ter confiança de que esse velocímetro seria mesmo capaz de medir com precisão se fosse o caso dos campuseiros estarem ali ligados com conexões acima de 100Mb/s.

Conclusão? Inconclusivo!... Ficamos sem saber se o pessoal do Campus Party não estariam por acaso com limitações de 73Mb/s em suas conexões (esse número é a conta certa feita a partir dos 8,6MB/s que obtivemos). Mas essa é sem dúvida uma conexão muito boa já!!...

No próximo evento a gente monta um servidor animal mesmo, aí vamos testar pra valer!... :)



Mostrei este post ao Gorpo, e ele disse: “poisé, por isso que eu digo... Se vc tem uma dúvida sobre a Internet, pergunte sempre a um engenheiro eletricista!...”

2008/02/11


Sobre hot-spots abertos, torrents no talo e os problemas no compartilhamento da Internet em casa

Andei discutindo com algumas (mais de duas) pessoas anônimas sobre liberação de acesso do seu roteador a seus vizinhos, e sobre a etiqueta que se deve observar ao gozar do privilégio. Tão me chamando de nazista por aí porque eu botei senha no roteador do meu avô, e porque eu acho que quando vc entra numa rede não deveria ter que se preocupar sobre a banda que está ocupando... Permitam-me discorrer um pouco melhor sobre estas duas questões:

1_ Eu jamais configuraria o roteador de uma outra pessoa pra deixar a rede aberta, sem senha. O meu, em casa, eu deixaria, porque sou eu quem vai administrar, vou ter plena consciência do que isto significa. Mas o dos outros eu deixo fechado por default.

É como decidir deixar a porta de casa sem fechadura. Você não instala uma porta na casa de alguém e deixa sem fechadura. Vc deixa a fechadura lá, e se a pessoa quiser deixar destrancado, ela que deixe. Mas antes ela precisa aprender a trancar e destrancar.

Quando alguém mais experiente configura um sistema pra outra pessoa utilizar, tem sempre que deixar configurado da forma mais fechada e segura possível. Isso obriga o usuário a aprender a abrir o sistema. Ao mesmo tempo em que aprende isso, ele aprende sobre o funcionamento e configuração e manutenção do sistema, e assume as responsabilidades.

Quem configura um sistema, tem responsabilidade sobre ele. Se o usuário optar por fazer algo perigoso, ele tem que ter consciência de que vai estar fazendo isso.

Configurar um roteador pra uma pessoa que não domina a tecnologia é um pouco como construir um apartamento para alguém. Você não constrói um chão que agüente só 200kg/m2 sem avisar o usuário (e confiar nele). Vc constrói pra agüentar lá uns 500kg/m2, a não ser que ele te peça, e que vc tenha certeza de que ele sabe o que isso significa, e que ele seja o responsável por um eventual acidente.

Vc não pode deixar a rede aberta se for você o responsável pelo bom funcionamento dela, mas não vai ficar lá administrando todo dia. Vc tem que ter certeza de que o usuário vai vigiar se não tem algum mané atrapalhando a conexão dele. Senão o CREA te detona... É a vida dos engenheiros desde os tempos de Hamurabi.


***
2_ Eu acho que se você é legal, e deixa sua rede aberta, e alguém entra nela e começa a baixar 10.000 torrents e de repente você não consegue mais usar sua própria conexão com a Internet, esse cara é um mané, e se vc quiser eu te ajudo a ir lá e dar uns sopapos na cara dele. Mas acontece que a filosofia em que se baseou a construção dos protocolos TCP/IP é totalmente contrária à idéia do usuário na "folha" da rede terem que ficar vigiando o seu consumo da banda.

O TCP envia pacote o quanto dá pra enviar. Se tem coisa pra mandar, e se tá indo, ele manda. Mas conforme os pacotes vão demorando pra chegar do outro lado --- ou melhor, conforme os ACKs vão demorando a chegar de volta --- ele vai esperando, e assim a velocidade da transmissão vai naturalmente se ajustando aos recursos. E essa flexibilidade se reflete em todas camadas acima do TCP também. Por isso ninguém devia ter que ficar limitando o funcionamento do seu BitTorrent.

Se você tem uma conexão de 20kB/s, e tem uma conexão TCP ocupando tudo, e de repente você liga outra conexão paralelamente, em um sistema convencional as duas vão aos poucos se ajustando pra dividir irmãmente a conexão. O protocolo funciona assim, ele é meio "passivo". E esse é o maior motivo do sucesso do TCP/IP. Não tem muita discussão, ele simplesmente vai tomando conta do que pode, e se não pode, abaixa a bola.

Como o TCP/IP funciona dessa forma, pra um roteador limitar a velocidade das conexões de um usuário basta ele levantar a estatística de quantos pacotes vc tá enviando. Se vc começa a enviar demais, ele simplesmente joga seus pacotes extras no lixo. Isso acontece até vc aprender quanto vc pode ocupar. E na prática vc acaba sempre transmitindo um pouquinho acima do que pode, porque é assim que vc efetivamente mede o quanto é que pode.

É assim que funciona... Quer dizer, é assim que nossos roteadores DEVIAM funcionar. Essa era idéia lá nos anos 90. Só que esses roteadores paias que essas d-link, 3com, cisco e outras fabricantes enfiam pela nossa goela não fazem isso não meu chapa. O que os engravatados decidiram é que o povão ia ter que se contentar com roteadorezinhos vagabundos que não te permitem ter um controle adequado de alocação de banda entre os clientes do roteador.

E a coisa mais podre do mundo não é nem a falta de controle de banda. É o problema do número de acessos do roteador. Acontece que esses dispositivos são quimeras bizarras que nada tem a ver com o verdadeiro TCP/IP. Essas porcarias todas dividem a conexão entre os clientes usando NAT, que é uma meleca duma gambiarra feia que não devia existir. Por causa dessa maldição contemporânea, nosso "roteador enxerido" é obrigado a ter uma lista de todas as conexões TCP ocorrendo em nossa rede, ao invés de ser de fato apenasmente um roteador de IP. E se o limite de conexões for ultrapassado, vc tá perdido irmão...

Esses roteadorezinhos que a gente usa não foram projetados pra dividir direito a conexão entre clientes desconhecidos. São brinquedinhos pra colocar em casa, e dividir uma conexãozinha entre duas máquinas, e mais uma impressora estribada da vida. Na hora que algum zé mané inventa de deixar o torrent ligado "no talo", ao invés da máquina dele ser naturalmente limitada pelo roteador, como deveria ser, ele acaba engasgando o roteador.

Então aqui que vem minha briga. Não pode ser considerado falta de ética uma pessoa entrar numa rede e sair tentando consumir todos recursos dela, e efetivamente conseguir. É falta de ética a D-link, 3com, Cisco e amiguinhas venderem pra gente estas bostas. É falta de ética as empresas chamadas "provedoras de Internet" não moverem um dedinho mínimo pra acabar com essa porcaria chamada NAT. É falta de ética a gente ser vítima de um bando de executivos babacas que só querem saber de ganhar dinheiro oferecendo pra nós um servicinho que não é sombra do que a tecnologia que existe é capaz de realizar.

Falta de ética é vivermos em 2008 sem conseguirmos imaginar quando se dará o fim do NAT e a ascensão do IPv6 e a popularização de roteadores que prestam. IPv6 tá fazendo 10 anos de vida.

Falta de ética maior é nosso povo viver absolutamente desinformado acerca da exploração que está sofrendo, a ponto de algumas pessoas serem capazes de imaginar que o sofrimento causado em nosso dia-a-dia quando temos estas disputas mal-resolvidas nos compartilhamentos de conexão em nossos roteadores são devido a um mal-comportamento incivilizado de seus pares, ao invés da ganância, preguiça e outros vícios desses engravatados dessas mega-corporações tipo as "provedoras" de Internet e os fabricantes de equipamentos... E também o Bill Gates (pronto, falei!)

Os roteadores que usamos hoje são como dispositivos de uma tecnologia avançada colocada sem proteção na mão de crianças. Resultado: uma machuca a outra e elas dizem que a culpa é da criança que não soube brincar. Não uai. A culpa é de quem colocou na mão delas uma coisa mal-feita. A culpa do engenheiro, como é desde os tempos de Hamurabi.

E eu fico puto porque esse assunto é tão importante pra mim, e ninguém tá pouco se importando. Eu acho sim que se alguém detona sua conexão ele é um babaca. Mas a gente não pode falar com naturalidade, como se fosse normal ter esses roteadores defeituosos. É isso que tem que mudar, e não as pessoas que querem ocupar toda a banda disponível.

Quando a gente se dispõe a tratar do assunto sem questionar a tecnologia maculada que tá dentro destas caixinhas mágicas prateadas em nossas mesas, a gente tá ficando de quatro pras empresas jogarem a canga no nosso pescoço. Quer dizer que estamos aceitando de fato que é assim que vai ser e pronto. Não é assim não gente. O que tem que mudar são estas bostas dessas máquinas. A gente não pode aceitar viver num mundo em que a gente tem que ficar vigiando o funcionamento de nossas máquinas pra não machucar inadvertidamente (ou não) nossos vizinhos de LAN.

Não era pra alguém ser capaz de detonar sua conexão ao entrar em sua rede que você tão gentilmente cedeu. Não era pra isso ser possível. E não é nem igual carro, por exemplo, que vc pode matar alguém se usar errado. Num roteador padrão, funcionando do jeito certo, não deviam acontecer essas merdas. A gente não pode aceitar essa condição. A gente tem que lutar é contra isso.

Quando vc simplesmente aceita o roteador como ele é, e o seu sistema operacional como ele é, e começa a criar regras de conduta em sua sociedade em decorrência da forma como a tecnologia está se apresentando pra você, vc está se deixando manipular. Você está cedendo na disputa cyberpunk entre dominar a tecnologia, ou ser dominado por ela. Você está tratando a tecnologia como um fato incontrolável da natureza, e os fabricantes desta tecnologia acabam sendo deuses no seu mundo, decidindo seu destino.

Aquelas frases do Heinlein e do Clarke falando sobre tecnologia avançada parecer mágica são exatamente isso aí. A gente tá achando mais fácil mudar nossa vida, nossa conduta, e criar regras sociais do que mudar a própria tecnologia. Estamos nos curvando à tecnologia que devia ser a nossa escrava. Está tudo de ponta-a-cabeça.


***
Eu já causei problemas em redes dos outros inadvertidamente mais de uma vez, por causa desses nossos roteadores toscos e redes mal-feitas. Na minha experiência, sofri mais ao machucar os outros sem querer, do sofri recebendo ataques dos outros. Vai ver que é por isso que insisto em nunca jogar culpa nos usuários...

2008/02/04


Vexação digital paulista, ou a bacia convexa.

São Paulo vive hoje vítima de um certo "provedor de acesso wi-fi para estabelecimentos comerciais" chamado vex.

Essa empresa trabalha assim: eles instalam pra você o roteador lá (um "AP", que permite pessoas entrarem numa rede IEEE802.11 local), e esse equipamento vai fornecer pros seus clientes o acesso sem fio. Sei lá como o comerciante paga eles lá pra administrar isso... Acho que paga só uma instalação, mas não sei. O que importa pro comerciante é que ele "tem wi-fi" ou "tem wireless" ou "tem AP" no negócio dele (cafés et cetera).

Só que não é que nem tantos lugares do planeta em que você chega com sua máquina e sai usando. Não é que nem, por exemplo, o Café com Letras em BH. Lá vc chega com seu dispositivo, e sai usando numa boa. No shopping Pátio, no Savassi, vc chega lá e sai usando. Seja no café do segundo andar, seja no T.G.I Friday's, é só sentar e usar, e pedir um cafezinho pra não ser cara-de-pau. No Vitrola tem que pedir a senha pra eles, mas aí é tranquilo. No quinta avenida tb, é só entrar e usar (mas não pode usar a tomada que o segurança briga com vc). No status eu vi q tem rede, mas não sei como funciona (não é liberadão, mas talvez tb seja só pedir senha)

De qqr forma, em BH, ali na Savassi, tem X lugares onde vc pode ir e usar a Internet numa boa. Passei uma mês lá agora, e o Café com Letras foi meu escritório. Ia lá todo dia usar a Internet (eu tinha q terminar 3 artigos, mais um poster...) Ia lá direto, usava a Internet sem problemas, largava uma quantia absurda de dinheiro, mas ficava totalmente satisfeito.

Aqui em São Paulo, querido, a coisa não funciona assim...

Passei semanas, meses ouvindo falar sobre o tal Starbucks que ia abrir, e por algum motivo estranho, uma das coisas que mais se ouvia falar do tal Starbucks é que ele ia ter Internet sem fio. (Como se fosse tão absurdamente inconcebível essa idéia em qualquer outro estabelecimento.) Quando comprei meu maravilhoso Compaq v6210br, fiquei louco pra ir lá entrar na Internet.

Qual não foi minha surpresa que descobri que o acesso era via o tal Vex... vexaminoso. O Fanz (nas FNACs) é a mesma coisa. O café boca al lupo perto da casa da minha namorada, mesma porcaria.

São Paulo vive vítima desses caras. Não tem um cafezinho que não tenha se rendido a eles. Não dá pra ser um hacker feliz nessa cidade sem contratar os serviços de alguma das porcarias de provedores filiados ao vex...

Entrei no tal site querendo contratar algum. Nem pensar garoto. Ou o acesso por wi-fi é na verdade indireto, vc ganha o direito por causa de outros produto mais complexos que vc adquiriu, ou então é simplesmente caro demais.

Tenha dó, pagar 30, 40 reais por mês pra poder ler e-mail no shopping no final de semana? poupe-me! poupe meu dinheirinho!!...

***

Eu moro numa toca sombria e selvagem. Não tenho TV a cabo, não tenho speedy, não tenho c*isa nenhuma. Não tenho planos de celular mirabolantes de claro, vivo ou oi da vida. não assino Estado de Minas (vá lá, eu assinto a Nature). Mas eu também existo, pô! Mas eu não tenho vez em São Paulo. Tenho notebook, tomo cafezinho gourmet, moro por aqui, mas ainda assim foi decidido que eu sou parte de um segmento da população que não merece passar pela "complete wireless experience" em São Paulo. (complete wireless experience é pegar seu notebook e fazer alguma coisa com ele, śo na bateria, usando a Internet, e tomando um cafezinho ou equivalente. É de falto algo emocionante que todo homem contemporâneo precisa experimentar.)

O que o vex faz é efetivamente elitizar o acesso wi-fi nessa cidade. Aqui não é qqr jacu com um notebook ou aipod-tutch que sai passeando pela pela urbe entrando na Internet. É só a "nata", ou a "panna" como se diz no starbucks.

Eles são um instrumento de alargamento do digital divide, ou "digital gap". São imperialistas contribuindo para a opressão social, a sociedade de castas.

Isso anda na contramão do telefone celular pré-pago, por exemplo... Coisas assim.

***

E tem mais, lá no starbucks é bonito e tal, tem sim um climinha bacana, mas hoje pedi um café e não achei muito bom não. (o muffin eu confesso que tava ótimo). Das outras vezes achei que o café tava uma porção generosa praquele preço (3,00, com chantily/creme/panna...) O mesmo que eu pagava me outros café em campinas, por exemplo. Mas hoje testei, pedi numa xícara, e veio numa xicrinha minúscula, absurda!!!... Onde já se viu? E tá 3,10 ainda.

Tomara que surja logo por aqui uma reação, com a fundação de novos cafezinhos, melhores do que o Starbucks, e com Internet sem-fio liberada. Paulista bem gosta desse negócio de "reação". Estou vendo já o "café MMDC"...


Depois fala que mineiro é caipira. BH tá anos-luz à frente de Sampa em termos de cafés e de Internet sem fio.

Os cafés de São Paulo são só esses lances meio mcdonalds aí. Ou é megastore, ou é chicoroso e elitista, ou é um buteco copo-sujo escroto. Isso é são paulo... Não tem nada que lembre a boa Savassi... Cada dia aqui é menos mistério pra mim porque a vida em BH gira em torno daquela minúscula região da cidade.

Sabe um lugar que tinha wi-fi que não tem mais? O Standcenter. Tinha lá, tudo OK... Aí bem quando comprei o notebook parou de ter. Agora não tem mais é o próprio Standcenter. (tá fechado desde antes do Natal)

o vex contribui pra mais uma letargia nessa cidade. Dizem que são paulo é "caótica", mas é mentira, essa cidade é letárgica. É tudo parado.

As ruas asfaltadas, as vias para o veículos automotores, são promessas de deslocamento veloz, promessas de transporte industrial futurista, mas o que acontece é o engarrafamento, tudo parado, alagado, amontoado. As pessoas vão rastejando pelas ruas como montes de folhas secas sendo empurradas pela enxurrada na sarjeta.

O vex é isso aí, uma promessa de tráfego de informação não-realizada. Zilhões de APs se espalham pela cidade, mas você tá ali com seu notebook (carro), mas não pode entrar, Não anda, fica parado. Aquela informação que deveria trafegar fica parada num sinal vermelho. Não pode estacionar porque não deu dinheiro pro tomador-de-conta.

Cadê o maravilhoso caos? Como vou poder pilotar o caos do mundo digital contemporâneo assim? São Paulo não é uma cidade Philogroky...

Vex é o vexame da democracia digital

***

PS: A "bacia convexa" é o seguinte: hoje fala-se muito em "convergência", e a convergência ocorre num sistema dinâmico onde há uma "bacia" de atração. Tudo que cai nessa bacia é atraído ("converge") pro centro. Em São Paulo a bacia é convexa, a convergência é pra marginalidade do atrator... (é portanto uma divergência...)