2009/06/25


Perdi meu emprego por causa da greve da greve

Eu sou o bobo-alegre segurando o cartaz nessa foto do UOL.

Passeata anti-greve na USP muda de trajeto por temer violência de grevistas

É impressionante a capacidade dos fotógrafos jornalísticos de te flagrar no único segundo que você sorri em todo um evento. Sorte que eu não botei o dedo no nariz ou bocejei, porque eles iam adorar tb.

Vou contar a história desse slogan que alguns aparecem ter gostado, mas sem entender direito. Em primeiro lugar, é uma variação de uma piada muita antiga, que não tenho certeza se aprendi na MAD, mas foi em algum lugar parecido. A um tempo atrás havia um slogan, que é usado até hoje: "Vá ao teatro." Como campanhas teatrais podem às vezes ser um pouco insistentes chatas e radicais demais, algum engraçadinho inventou um dia de subverter o slogan: "Vá ao teatro, mas não me chame." Eu só reaproveitei adaptando pro contexto atual...

Eu pensei em fazer esse meu cartazinho A4 "SMS" depois de pensar em muitos outros slogans. Um era: "democracia é respeitar as minorias". Cansei de ouvir em conversas sobre quem que é a maioria ou minoria. Pessoas debatem sobre se a maioria quer ou não a greve. Discutem sobre quem foi a maioria em assembléias... Isso não interessa tanto. Democracia não é a famosa "ditadura da maioria", democracia é uma situação onde minorias são respeitadas apesar de serem-nas.

Interessante comparar isso com aquele período da revolução russa em que a maioria "bolshevik" deixou de fora do poder a minoria "menshevik". Varreram-nos para a lixeira da história. Isso não é bonito não. Tem que deixar os chatos da minoria lá com suas manias...

Democracia é tolerar a existência de seus dissidentes, e até mesmo a necessidade de conviver com eles.

Então é isso. Eu não tenho nada contra o teatro. Eu até gosto de ir de vez em quando sim. Mas me deixa em paz, pô!

Não sou contra a greve não. Não gosto da reitoria, e sei que a greve não está ocorrendo à toa. Mas se eu ainda não me convenci que eu devo parar, me deixa trabalhar.

Meu protesto não é contra os trabalhadores em greve na USP hoje, e os alunos e professores apoiando-os. É antes contra a cultura do que assassinaram Trotski.

A propósito, fiz este pequeno cartaz usando o Inkscape, e a fonte é a DejaVu Sans, com as proporções levemente distorcidas.

2009/06/24


A diferença entre a tartaruga, o navio e os hackers

Existe um famoso texto que meio explica a idéia da cultura do software livre, acho que escrito pelo Eric S Raymond, chamado "A catedral e o bazar". Não pode ser dito um texto "fundador" do movimento, igual poderia ser dito para o princípio do Linux do famoso e-mail do Linus brigando com o Tannembaum, mas é um texto legal, bastante conhecido e citado...

Por causa deste e outros textos, e pela ação de muitos outros porta-vozes do movimento, hoje temos um número significativo de pessoas que se dizem aderentes desta filosofia, e reconhecem a diferença entre as duas culturas (da catedral e do bazar).

Tem gente hoje que meio se considera de uma "tribo dos fãs de produtos livres", o que inclui software e ainda arte de vários tipos, ou a Wikipédia e tal. E um fenômeno interessante que está havendo é que cada vez mais pessoas desta tribo não fazem parte de uma outra tribo muito relevante, os hackers.

Hackers e sua cultura estiveram no centro do desenvolvimento do software livre. Stallman RMS é um super hackerzão, e o mesmo vale pro ESR. Qualquer programador de compiladores e de coisas próximas ao sistema operacional, como drivers, são hackers queiram ou não, pela natureza destes programas... Funcionam numa área do sistema muito distante daquelas ilusões que hipnotizam os usuários.

Hackers sabem que telas de CRT são na verdade uma grande lâmpada que pisca a cada x segundos. Mais especificamente um pontinho de luz que vai correndo pela tela e mudando de cor. Eles não só sabem, como qualquer pessoa mais culta precisa saber, como ainda tem as manhas de vez ou outra se aproveitar disso pra fazer um dia algum programa que resolve um problema...

Hackers conhecem a fundo o detalhe de funcionamento das coisas, e exploram esse conhecimento para realizar às vezes proezas não imaginadas pelos usuários habituais, e por vezes nem mesmo pelos projetistas dos sistemas. Isso pode significar desde criar verdadeiras funcionalidades novas num sistema, até encontrar infelizes falhas de segurança. A ação de hacker de moral mais "flexível" explorando este tipo de falha de segurança encontrada rendeu à classe uma má reputação entre os leigos.

Mas como eu dizia, no princípio da cultura do software livre (e nem tanto das coisas livres em geral) boa parte dos usuários eram hackers. Programadores trocando entre si códigos hackers que faziam coisas hackers e permitiam aos usuários fazer coisas hackers. Isto significa, por exemplo, distribuir códigos-fonte e organizar os sistemas de uma forma "aberta", facilitando aos usuários hackers criar programas que saem por aí interagindo de maneira automática com outros programas dando origem a aplicações muito interessantes, às vezes até inusitadas ou inúteis, mas que muitas vezes exercitam os limites da tecnologia.

Mas aí tivemos coisas como o Setembro sem-fim. A tecnologia começou a ficar mais e mais acessível e a atrair mais e mais o interesse de pessoas nem tão hackers assim, seja por falta de perícia técnica, ou seja por não ver mesmo a graça no jeito hacker de ser.

Hoje temos um movimento software livre que é largamente povoado por não-hackers. Isso é a realização, até certo ponto, daquele sonho que muitos tinham de que o Linux "dominasse o desktop", se tornasse um sistema sendo utilizado por usuários comuns que geralmente usavam apenas o rwind0ws que vem "da fábrica". (Aliás outro fenômeno que começou a ter depois ali de 1993, isso das máquinas já virem da loja com o sistema operacional instalado, e eventualmente se tornar algo impossível você comprar uma máquina sem comprar um M1krozofd Wintous instalado ao mesmo tempo.)

O Linux dominou o desktop, pois. Não está sendo um domínio de larga escala, como eu mesmo achei que fosse ser. O que está havendo é essa criação de uma terceira cultura. É gente que não é hacker, mas que não usa wirdlowz. São talvez um pouco mais bem-informados do que a maioria dos usuários de Uimdols sim. Mas não acham legal ser hacker. Não acham legal "hackear" nada.

Uma marca pra mim que separa o hacker dos usuários não-hackers de Linux e FLOSS, é o Ubuntu. Quase todo usuário de Ubuntu que eu vejo São esses jovens que ignoram a noção de "hackear", e chegam até a se preocupam em se afastar da cultura hacker, porque sabem que são muitas vezes identificados como criminosos. Alguns até ACHAM isso. Mas aí querem se afastar porque isso atrapalha a grande "luta" deles de realizar lá o tal sonho de dominar o desktop.

Eu fico puto. Quer dizer, ficava, porque no começo achava que era uma coisa só: ser hacker e usar FLOSS. Hoje fui obrigado a entender que não. Os neófitos vieram, meio que tomaram a causa FLOSS pra eles das mãos de quem se preocupava com a causa, e jogaram os hackers na lixeira da história (se é que eles já não estavam chafurdando por lá esse tempo todo.)

Quem estava pouco se lixando pruma grande causa FLOSS continua sem se importar, tá lá escovando seus bits. Quem estava prevendo isso aí mesmo está batendo palmas. Eu sou de uma terceira categoria. Eu tive a ilusão por um tempo, e hoje vejo como era algo muito errado, de que a tal dominação do desktop seria uma conversão de toda a humanidade para se tornarem hackers cyberpunks malucos electro-hippies tipo o Stallman assim. Mas não!

A dominação vem dessa forma aí, formação de um público ciente da diferença entre FLOSS pra coisas como o Weird-OS dos Will Grates, mas que não é hacker não. Não tem as manhas e não ligam.

O motivo porque eu vim aqui hoje finalmente escrever esse texto, que já tava matutando há algum tempo, é que entrei aqui no site do FISL querendo ouvir a rádio do evento. O que eu queria? Entrar fácil no site, de preferência via elinks, meu browser favorito que funciona no console, achar rapidamente o URL pro stream da rádio, copiar e colar numa linha de comando e ouvir com o mplayer.

O que houve? Entrei no site via Firefox (só porque tava aberto!), cliquei num link que achei lá da rádio, e o que aconteceu? Primeiro um popup de alguma coisa que me pareceu ser um applet de Java perguntando alguma coisa que eu não li, oferecendo um checkbox que não sabia se era pra checar ou não, com dois botões. Aí apertei um dos botãozinho lá pra deixar ele feliz, e então apareceu dentro do browser um maldito playerzinho lá tocando a droga da rádio.

Ô diacho! Não é possível!! Me dá o stream!!! Hacker quer o URL do stream, pra abrir com o programa que quiser, de preferência um programa bem bizarro, que redireciona o stream entre várias coisas difíceis de explicar e justificar.

Mas não, não achei em lugar nenhum.

Sei lá, de repente eu que sou burro e não vi onde tava escrito, procurei no lugar errado. Mas isso não interessa. Se eles pensassem como eu o link estaria escrito num lugar que eu teria visto.

Situação? Hoje é mais fácil pra mim ouvir a CBN, de que eu descobri uma vez o URL usando engenharia reversa no site deles, do que a rádio do FISL. Eu até tentei rapidamente olhar o código fonte do site deles pra tentar descobrir o URL, não consegui. Logo, o FISL é tão hacker quanto a Rádio Globo. O nível de domínio técnico do pessoal do FISL é tão grande quanto o da Daniela Braun do IDG now.

Isso é ruim? Claro que não. Só tou falando, oras.

O mundo é feito de Daniela Brauns, oras. Eu já aprendi minha lição, no dia em que acabou minha adolescência: eu vivo no rabo da gaussiana, sou um outlier, e tenho que me conformar e deixar de ser chato.

Hoje gente como eu e o Stallman e sei lá mais quem (provavelmente muitos leitores deste blog) são conhecidos como "tards", de "retard" com ênfase em ser alguém do passado. Ubuntu é "legal" e Debian é "coisa de tard", que os retardados perdem tempo fazendo "errado" e os descolados "consertam" pra fazer o Ubuntu e tantos outras distribuições que "consertam" o Debian de alguma forma.

Essa visão tem muito a ver com a que eu mesmo tinha, mas agora adquiri uma perspectiva histórica melhor. FLOSS não representa tudo do movimento hacker, de forma nenhuma. Nós não somos portanto pessoas que pararam no tempo dos primórdios do FLOSS enquanto uma nova geração faz o "FLOSS 2.0".

Hackers são o que sempre foram e haverão de ser, FLOSS foi tipo um "spin-off", que nem mesmo dependeu só dos hacker pra existir, e não resume esta cultura (alguns hackers nem se importam com isso, tipo uns malucos que trabalham no alto das torres de marfim da IBM, Intel e ARPA desde os anos 1970). A associação das duas coisas (culturas FLOSS e hacker) não é uma dependência formativa, um não deixa de existir sem o outro...

Portanto podemos perguntar: qual a diferença entre um usuário de FLOSS e um de softwares proprietários? É meio difícil responder, viu... Por exemplo, nenhum deles paga pra usar o software (boa parte dos usuários de SW proprietário usam cópias piratas). A qualidade do software que todos eles usam é também, em boa parte do tempo, baixa. E estão todos cada vez mais dependendo mais de páginas da web baseadas em flash do que qualquer coisa, e isso é todo um mundo diferente daquele onde se separa FLOSS da alternativa.

Uma diferença importante hoje em dia entre o usuário de FLOSS e os outros é que quem usa software proprietário é muito bem-aceito por seus patrões, enquanto que o usuário de FLOSS é recriminado.

E os hackers? Vão bem obrigado!

2009/06/23


Falando bem, de vez em quando. ANATEL vs Telefonica e Huawei.

Eu costumo a sempre falar sobre como as pessoas jogam muito a culpa de problemas da Internet em usuários e em hackers, mas quem rpecisa ser cobrado são os administradores de redes, ISPs e os fabricantes dos equipamentos. Estes últimos em especial vivem meio cobertos do resto do mundo por uma nuvem mágica de proteção que faz com que muitas pessoas nem se dêem muita conta de que eles existem e de que possuem responsabilidades.

Estão saindo umas notícias desde o final da semana passada sobre a ANATEL brigando com a Telefónica por causa do Speedy que estão me deixando com uma muito boa impressão do órgão governamental. Há algum tempo o Speedy começou a apresentar umas falhas de vez em quando, entrando em perídos de várias horas fora do ar a cada tantos dias. A ANATEL já estava desde então no calço da empresa.

Agora recentemente a Telefónica anunciou um desejo de vender o Speedy, e se livrar dessa coisa inconveniente, mas a ANATEL interviu! Proibiu a venda até que se comprove que o serviço volte para um estado aceitável de qualidade. Abriu lá tb não sei quantos processos administrativos contra a Telefónica, e ainda contra a empresas que fizeram a certificação da empresa, e contra a própria Huawei, fabricante de roteadores que causaram (ao menos me parte) os problemas.

Fica essa notícia aqui então como exemplo do tipo de coisa que eu quero ver. Bota esses caras na parede, vai lá na fábrica e diz "amigo, esse seu equipamento não é bom o bastante..." É isso que falta, não é bater na cabeça dos usuários não.

Alguns links

Anatel proíbe Telefônica de vender Speedy http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u585185.shtml Veto à venda do Speedy prejudica provedores e novos clientes, diz associação