2007/12/07


Sid Vicious

Volta e meia aparecem umas palavras que vão se espalhando, como num surto de uma doença. Viram meio que moda por um tempo, às vezes somem, às vezes ficam. Não sei se é bem um fenômeno real ou apenas uma impressão minha, mas esse sentimento deve ser o mesmo que inspirou Burroughs, e ainda o que inspira alguns filósofos quando encanam com esta o aquela palavra ou conceito... Ainda é certamente o tipo de questão que atraia alguns estudiosos da língua...

Um conjunto de palavras que me chamou a atenção recentemente foram encetar, entabular e elencas, esta última em maior destaque. De repente um monte de gente começou a usar ocm muita freqüência, e em minha opiniáo às vezes até elncando estas palavras de forma meio descuidada em seus textos.

Uma palavra que tem me chamado a atenção nestas últimas semanas é "vício"... Ficou muito em voga quando se falou muito em ser viciado em drogas, ali nos anos 80... Hoje virou "adição", e mais caso de saúde pública do que era o "vício" realmente... Não ouço hoje falar tanto em "vício" e em "viciados" quanto antigamente. Mas de repente também pode ser por exemplo a minha idade... Talvez os mais jovens ainda ouçam muito sobre o assunto, lendo o
Estudante, e livros da Adelaide Carraro.

De qualquer forma, o que é isto, afinal, o "vício"? Uma abordagem mais zen, non-sense e dadaísta do assunto sempre menciona jocosamente o quanto somos todos "viciados" em oxigênio e água... Isto naturalmente revela a natureza de "dependência" que o vício implica. Viciados em drogas também são muitas vezes chamados de dependentes, às evzes como eufemismo, às vezes com objetividade.

Vício implica, é claro, em algo maior. Primeiro porque pode se tratar de uma certa dependência psicológica. É algo de complexo esta dependência psicológica, um sentimento muito pouco compreendido. Até porque no fundo toda dependência psicológica tem seu fundo químo, sendo este o substrado do organismo humano.

Temos aí viciados em joguinhos de computador, jogos de azar, sexo e outras coisas. O vício fala entretanto mais do que de dependência química ou da obscura dependência psicológica, fala de MORAL. O vício é uma dependência CONDENÁVEL, uma dependência desprezível. O viciado é um ser desprezível, e daí a necessidade por se buscar por eufemismos ao tentar tratar os "dependentes" e "adicionados".

Portanto é uma afirmação forte quando, por exemplo, um apresentador da CBN fala sobre o vício da população em binguinhos eletrônicos. Ele está falando sobre um costume desprezível, que a sociedade deve recriminar. Estamos falando daquelas coisas que dão asco, e que a "sociedade de bem" combate sendo elas ilegais ou não.

É uma ferramenta política então. Convencer um grupo de pessoas que um certo comportamento é um vício é convencê-las a recriminar os viciados. É fazer surgir toda uma classe de cidadãos inferiores. A vicialização de uma cultura é um instrumento de diferenciação social, fonte para repressão, guerras, genocídios e etc.

"Vício" tem ainda uma outra conotação muito interessante, que não tem mais a ver com dependência e com costumes e culturas. Algo "viciado" é ruim, mas é pior do que isso. Quando uam coisa ruim decorreu de um "vício", estamso falando de algo quase igual a uma possessão demoníaca. Um "vício" é como um incubus que toma conta de um desafortunado e o faz cometer infâmias.

Presenciei um discurso outro dia em que se acusou uma organização de ter sido administrada "com vício", havi a "um vício" permeando as atividades dos dirigentes. Neste sentido não entendo o tal "vício" não é nem apropriadamente uma má-intenção, nem como a ingenuidade inconscinete de um homicídio culposo, digamos. É uma coisa semi-consciente, é um pensamento consciente que age por trás de você. É mesmo quase como que um espírito ou fantasma que pode ser responsabilizado pelos atos condenados!...


O interessante então é isso: o "vício" é uma coisa que na verdade não existe. O dependente, ou "adicionado", não é diferente do "viciado". Uma "má-administração" se caracteriza física e logicamente, ao meu ver, da mesma forma que a administração "viciada". O vício é meio que evocado para ser recriminado de uma forma diferente, nem objetiva, nem com piedade. O "vício" é a "fonte do mal", as "forças do mal". "Vício" é quase uma prosopopéia de tudo que nos desagrada, tal como o deus de Abraão é às vezes uma forma de prosopopéia do universo, ou apenas do que nos agrada. São quase que personificações de entidades inumanas que podem ser recriminadas ou louvadas.

Resumo: "Vício", cara... Presta atenção nesse negócio de "vício", isso é muito louco. Não é uma palavra qualquer.

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